Deputado Federal José Mario em Entrevista Comenta Agronegócio
Dificuldades com a crise econômica e política brasileira, barreiras no comércio exterior e na logística fizeram de 2018 um ano repleto de desafios para o agronegócio. Ainda assim, o balanço foi positivo tanto para o País como para Goiás. Nesta edição da Campo, o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) e deputado federal eleito, José Mário Schreiner (DEM), pontua os destaques e os caminhos importantes para ampliar a produtividade do setor também em 2019. Confira:
Qual balanço o senhor faz de 2018 para o setor do agronegócio?
Como sempre, foi um ano de muitos desafios. Porém, o setor novamente se mostrou competitivo e conseguiu extrair bons resultados ao longo de 2018. A disputa eleitoral trouxe grande instabilidade nas perspectivas econômicas do País, com implicações em variações elevadas no câmbio (dólar) e retração de investimentos, o que dificultou o adequado planejamento, não só do agro, mas de todos os setores da economia. A paralização dos caminhoneiros, que resultou na implementação do tabelamento de fretes, trouxe problemas na logística de produtos agropecuários e dos insumos, com encarecimento do transporte, travamento de negócios ao longo do ano e grande instabilidade com a indefinição da aplicação ou não da tabela de fretes. Outro desafio tem sido a guerra comercial entre Estados Unidos e China, que trouxe mudanças significativas no mercado mundial, sobretudo para a soja. Quanto à pecuária, os principais desafios vieram dos embargos nas exportações brasileiras de carnes para importantes destinos, o que acabou inviabilizando algumas empresas do País, prejudicando diversos produtores, em especial de aves e suínos. Outro ponto de impacto foi o ainda tímido avanço do consumo interno no Brasil, tendo em vista que os níveis de recuperação econômica ainda não são tão consistentes. No setor canavieiro o ano também foi desafiador, com produtividades em queda nas lavouras, custos de produção elevados, preços dos produtos menores e crescimento da participação do etanol, em que as margens são menores em relação ao açúcar. Mesmo assim, com todos esses desafios, com o empenho dos produtores e trabalhadores rurais – que acreditaram na nossa força e na necessidade de produzir alimentos e matéria-prima para o mundo -, e aguardando dias melhores e com o apoio dos demais elos empresariais antes e depois da porteira, ainda foi possível conquistar resultados satisfatórios de uma forma geral.
Quais os principais resultados alcançados?
Em relação ao PIB, o setor acumulou alta de 1,3% nos dois primeiros trimestres do ano, o que demonstra um crescimento tímido até o momento, porém superior ao observado nos setores de comércio, serviços e indústria. A produção de grãos alcançou 228,3 milhões de toneladas na safra colhida em 2018. Resultado positivo, mesmo tendo sido 4% menor que a safra anterior. Houve redução de cerca de 17% na produção de milho, o que representou quase 10 milhões de toneladas a menos do que em 2017 e crescimento de 4,6% na produção de soja, com produção recorde de 116 milhões de toneladas. A maior demanda chinesa pela soja resultou em exportações também recordes no ano. Até outubro já foram exportadas mais de 74 milhões de toneladas da oleaginosa, contra cerca de 68 milhões em todo o ano de 2017. No caso da produção de etanol, o Brasil registrou um crescimento de 11,6% no ano, superando 30 bilhões de litros. No entanto, a produção de açúcar teve um decréscimo significativo de 9,6%. No setor de carnes, o ano vem sendo de quedas nas exportações totais do setor, principalmente nos segmentos de aves e suínos. De janeiro a outubro de 2018 as exportações de frango registraram queda de 21,7% em relação ao mesmo período de 2017, enquanto as de suínos registraram queda de 36,1%. No caso das exportações de carne bovina o resultado, em 2018, está próximo do observado em 2017, com leve queda de 0,2% no período.
Houve avanços estruturais?
Quanto aos avanços estruturais, o ano foi de fortes debates legislativos na área das políticas públicas voltadas ao setor rural. Tivemos mudanças na previdência rural (Funrural), com a adequação das normas para a agropecuária moderna e atual; discussões sobre as mudanças na legislação de defensivos agrícolas, com proposição da atualização das normas de registro, que ainda estão em discussão no Congresso; a criação do RenovaBio, que pretende incentivar o consumo de biocombustíveis no país e dar maior previsibilidade ao setor, entre outros. Também é muito importante destacar que 2018 foi ano de grande incentivo à utilização de mais tecnologia no meio rural, com forte avanço da chamada agricultura digital. Percebemos o surgimento de startups voltadas ao desenvolvimento de ferramentas de agricultura de alta precisão, gestão operacional das propriedades, gestão financeira, entre outros.
Como o setor conseguiu se superar e inclusive ampliar produtividade em algumas atividades?
De forma geral, apesar dos graves entraves sofridos pela agropecuária brasileira, como logística e altos custos, a competitividade e a eficiência do setor ainda se mantêm aquecidas, o que deu suporte a obtenção de avanços mesmo num cenário mais adverso e desafiador. Os produtores rurais têm investido cada vez mais em ganho de produtividade e gestão, o que traz mais resiliência aos negócios rurais para enfrentar momentos de margens mais apertadas. Acreditamos que esta é a grande mola de crescimento do setor e foi isso que deu suporte para os avanços observados nesses anos de agravamento da crise econômica no Brasil. A eficiência e dinamismo do setor também tem dado suporte à manutenção e expansão do mercado externo dos produtos agropecuários, sendo este outro grande diferencial frente a outros segmentos.
Para Goiás, em especial, quais foram os destaques e os desafios de 2018?
Acredito que, em 2018, o principal desafio foi direcionado ao setor pecuário goiano, em especial a avicultura, que enfrentou embargos e fechamento de importantes empresas processadoras no Estado, o que gerou grandes problemas aos produtores do segmento. O que também se refletiu nas exportações, que no setor de frango vem registrando queda de 18% em valor exportado em 2018, enquanto no setor de perus a queda chega a 91% no período. As exportações de carne suína também foram impactadas, com queda de 68% no valor exportado por Goiás neste ano. Em função da dinâmica do mercado externo, do câmbio e da oferta interna, os preços de grãos ficaram mais altos neste ano, o que também impactou os custos da atividade pecuária. No setor de grãos, o resultado geral foi positivo, mesmo com a queda na produção total do Estado, que alcançou 21,2 milhões de toneladas neste ano (-2,8% em relação a 2017). Mesmo assim os produtores conseguiram auferir margens melhores do que no ano passado, tendo em vista a grande demanda principalmente na soja, que contou com a forte queda na produção da Argentina, a valorização do dólar frente ao real e a guerra comercial entre China e Estados Unidos. A soja obteve a melhor produtividade média já registrada no Estado. No lado do milho, segundo maior grão em produção, tivemos uma queda, ocasionada pela redução na área plantada e as perdas em função do clima adverso durante os meses de março e abril. Um ponto negativo muito presente neste ano foi o crescimento da insegurança na zona rural, onde foram registradas centenas de roubos, tendo como alvos insumos da produção agropecuária (defensivos), veículos, máquinas e animais. Este é um problema grave a ser enfrentado pelos novos governos estadual e federal.
Qual a importância do setor rural nesse contexto de crise econômica e política?
O agronegócio foi fundamental para a saída do País da recessão, tendo obtido níveis de crescimento bem acima dos verificados em outros setores. Nos últimos três anos, com o agravamento da crise econômica, o setor liderou o crescimento do PIB e a geração de empregos, se consolidando como a principal força motriz. Isso se refletiu na visão da sociedade quanto ao setor, que hoje reconhece de forma mais ampla a importância do agro. Ainda temos muito a avançar para que o agronegócio possa conquistar crescimento ainda mais efetivo nos próximos anos, mas certamente os resultados obtidos no passado evidenciam que o Brasil e Goiás precisam evoluir ainda mais no fomento às atividades produtivas rurais, garantindo o adequado abastecimento interno e gerando novos negócios que vão refletir em melhoria de renda e emprego.
Como o Estado se diferencia dos demais e pode ampliar sua competitividade?
Goiás tem grandes vantagens competitivas. A disponibilidade de terras para expansão das atividades agropecuárias, sem a necessidade de abertura de áreas protegidas, se aliada aos investimentos em tecnologia e gestão, nos dá condições de ampliar a produtividade da atividade pecuária, aumentando a produção de carnes e abrindo espaço para expansão da agricultura. Temos grande disponibilidade de recursos hídricos, que trabalhados dentro de um modelo eficiente de gestão dos usos múltiplos, nos dão condições de ampliar a produtividade e a diversidade de nossa produção com o uso mais intensivo da irrigação. Além disso, a localização geográfica oferece grande vantagem logística para as empresas que aqui se instalam, dando condições para que estas venham a suprir os importantes mercados consumidores no Centro-Norte brasileiro.
O que é preciso para ampliar a competitividade?
Para ampliar esta competitividade é preciso que cresçam os investimentos em infraestrutura, com melhoria das condições logísticas. Também é importante trabalhar na melhoria dos processos burocráticos do poder público, trazendo um ambiente de negócios mais favorável aos empreendedores que atuam no Estado. Trabalhar as principais reformas de que o País precisa para se tornar ainda mais competitivo, como as reformas tributária e previdenciária. Outro ponto crucial para expansão de todas as atividades econômicas é a melhoria do fornecimento de energia elétrica, que foi extremamente negligenciada nos últimos anos.
Qual é o cenário para a agropecuária em 2019?
É inegável que as mudanças no cenário político brasileiro e estadual trazem boas expectativas no que se refere ao poder público. Acreditamos que os novos governos terão foco na melhoria da eficiência do poder público, diminuindo a morosidade dos processos e reduzindo os custos da máquina pública, o que pode se reverter em menores impostos e maiores investimentos em políticas de desenvolvimento. Já na questão de rentabilidade das atividades rurais, as preocupações continuam, tendo em vista que o cenário econômico continua a ser bastante desafiador, com custos de produção crescentes e consumo ainda em recuperação. Como sempre, a eficiência dos produtores rurais será fundamental para garantir bons resultados, ressaltando a importância de se manter bons níveis de produtividade e investir em gestão, seja nos processos de produção como também na comercialização.
O que precisa de maior atenção do poder público?
São vários os pontos de atenção e melhoria em se tratando do poder público. Entre eles podemos destacar a logística. É preciso impedir a implementação do tabelamento de fretes, que cria uma tabela artificial de preços no transporte e se contrapõe aos mecanismos de livre mercado. É fundamental também garantir investimentos mais tempestivos na malha rodoviária, com a realização de novas pavimentações, duplicações e manutenção da qualidade das rodovias. É preciso também consolidar o funcionamento da Ferrovia Norte-Sul e garantir a ampliação do uso de hidrovias no Estado. Destaco também armazenagem. É importante ampliar a capacidade de armazenamento dos produtos agrícolas nas propriedades rurais, dando melhores condições de logística e comercialização da produção. A desburocratização também é fundamental, é preciso avançar na utilização de tecnologia e sistematização dos processos burocráticos, diminuindo os encargos às atividades econômicas e agilizando os processos internos exigidos pelas legislações trabalhista, ambiental e fiscal. Desenvolver uma política efetiva de seguro rural também dará condições de maior segurança aos produtores rurais e empresas do setor, fomentando a ampliação dos investimentos e produtividade de forma geral. A segurança rural também é um dos grandes problemas no campo e investir de forma maciça nesta área será fundamental. Melhorias na legislação voltada ao setor é outro ponto que poderá refletir em maior segurança jurídica e no desenvolvimento de políticas públicas que tragam efetiva evolução das atividades produtivas. Nos últimos dois anos, o Brasil sofreu bastante com problemas sanitários apontados em algumas atividades, em especial na pecuária. Precisamos trabalhar em políticas efetivas de fiscalização e adequação dos processos sanitários, evitando que eventuais inconformidades afetem a cadeia produtiva. Além disso, precisamos mostrar ao mundo e aos consumidores que o Brasil é sim um local que respeita os padrões mundiais de qualidade, realizando campanhas de fomento da inserção de nossos produtos no mercado externo.
O senhor acredita que será possível avançar em pautas como seguro e crédito rural?
Sem dúvida. Hoje o crédito advindo do Plano Agrícola e Pecuário não atende à demanda do setor, que capta a maior parte dos recursos para custear suas atividades no sistema privado, se submetendo a elevadas taxas de juros. Desenvolver políticas que ampliem a segurança jurídica dos investidores internos e externos pode atrair mais capital ao setor, além da necessidade latente de se desenvolver um plano de crédito para o médio prazo, ou seja, não apenas planos anuais, contemplando uma safra. O seguro rural bem implementado pode ser decisivo na ampliação da capacidade de crédito do setor, aumentando a segurança das operações aos investidores a aos empresários do setor. Pelo elevado risco da atividade, a expansão do seguro sem dúvida passa pela atuação do poder público, que precisa envidar esforços para viabilizar e massificar as operações de seguro voltadas ao agronegócio. É preciso colocar mais dinheiro na subvenção do seguro, dando condições para que o mercado securitário cresça e possa no futuro caminhar com as próprias pernas. Um seguro rural eficiente poderá garantir a segurança alimentar em nosso País. É importante destacar a necessidade de garantir a inclusão cada vez maior de médios e pequenos produtores no crédito oficial, que hoje muitas vezes não conseguem cumprir os requisitos para sua obtenção. É fundamental estimular a expansão dos projetos de investimentos, o que reverterá em maior geração de renda e emprego.
De que forma o Sistema Faeg Senar contribuirá ainda mais com o agronegócio em Goiás?
O Sistema Faeg tem participação fundamental na definição das políticas voltadas ao setor, colaborando na formulação de políticas públicas e setoriais de fomento a atividade. Como defensores dos produtores rurais e do agronegócio, o sistema tem papel importante na interlocução com os governos municipais, estadual e federal, levando as demandas dos empresários do setor e desenvolvendo projetos em parceria que alavanquem a atividade. Por meio do Senar, o sistema está comprometido com a melhoria dos processos produtivos no campo, sendo atualmente um dos principais indutores de capacitação de empresários e trabalhadores rurais, o que reflete de forma significativa na melhoria da eficiência do setor e na sustentabilidade social, ambiental e econômica. Trabalhamos fortemente na área de assistência técnica e gerencial, levando ao produtor o que há de mais moderno nos processos produtivos, melhorando a vida e renda destes produtores. Com o Ifag, temos trabalhos voltados ao desenvolvimento de projetos e estudos ligados ao agronegócio, colaborando tecnicamente na geração de informações valiosas aos produtores rurais, que facilitam suas tomadas de decisão. Além disso, estes estudos e projetos têm condições de nortear o desenvolvimento de políticas públicas e setoriais.Da informação Katherine Alexandria, especial para a Revista Campo
Jornal Comunidade em Destaque.
Foto: Larissa Melo